Todos os Orixás foram sincretizados pelo negro escravizado, com santos da igreja católica, pois era essa a única religião aceita e obrigatória naquela época. Exu também foi associado a um santo, entretanto, quando o homem branco conheceu Exu, com sua gargalhada, com seu tridente, bebendo cachaça e fumando charuto, imediatamente associou com o diabo da cultura judaico-cristã.
Em 1822 a costa da África ainda estava permeada de homens inescrupulosos, que ali compravam escravos para revendê-los em grandes centros nas Américas. Esses escravos vinham de povos do interior do continente e eram escravizados pelos próprios povos irmãos que, após atacar as aldeias, trocavam os sobreviventes por armas com os brancos.
Nesta data, um garoto de 13 anos chamado Ajayi foi capturado e, abordo de um navio negreiro, era levado para a América. Ocorre que a Inglaterra, nesta época, além de não mais fazer uso de escravos, coibia o tráfico negreiro. E foi em uma abordagem inglesa que o navio que carregava Ajayi foi obrigado a retornar à costa e libertar todos os escravos.
O garoto já não possuía família, nem amigos e nem sequer uma aldeia para onde pudesse retornar, sendo entregue, desta forma, aos cuidados da colônia de Serra Leoa, que era formada basicamente por religiosos cristãos europeus e ex-escravos repatriados.
Na colônia, apesar da resistência, Ajayi foi lentamente se convertendo ao cristianismo, abraçando a religião do povo inglês, o anglicanismo. Começa aí um grande passo para Ajayi, quando começa a receber aulas de inglês, o que cumina com seu batismo em 1825, e, continuando os estudos, foi ordenado pastor em 1843, quando assume o nome de Samuel Crowther, em homenagem a um eminente clérigo daquela religião.
Como pastor, Crowther teve papel indiscutível na comunicação dos religiosos com o povo ioruba, e, em face disso, publica o “Vocabulário Iorubá”, criando assim um dicionário de fácil uso para os ingleses. O fato marcante é que até este momento, o ioruba era uma língua apenas falada, não existia gramática. Foi Ajayi Crowther quem criou a gramática e criou o primeiro livro de livre tradução.
Depois de muitas colaborações como intérprete, religioso e escritor, Crowther dedicou-se à primeira tradução da Bíblia para o ioruba, fato concluído em meados de 1880. Ao traduzir a Bíblia, Samuel Ajayi Crowther traduziu Deus como Olorun e o diabo como Exu.
Esta é a primeira constatação histórica da deturpação da imagem de Exu pela cultura judaico-cristã.
No Brasil, fora a gargalhada e o tridente, as cores vermelha e preta, associadas a este Orixá, ajudavam a confundi-lo com o demônio.
Até mesmo alguns escritores como Aluízio Fontenelle, associou a figura de Exu com a dos demônios do livro Goécia em sua obra “Exu” de 1954, gerando ainda mais polêmica e confusão.
Essa confusão permaneceu e permanece na mente de muitos umbandistas até hoje, e é por isso que o mistério Exu deve ser estudado e compreendido de forma adequada. Pois, sem este Orixá, nada podemos alcançar na Umbanda.
Antes de qualquer coisa, é importante frisar que Exu não é o diabo, nem Satanás, não faz nenhuma oposição a Deus. Para os cristãos, o mal é simbolizado por um único ser, que após ser expulso do céu, atormenta os seres humanos. É conhecido como diabo, demônio, satanás, entre outros nomes populares. Para os africanos nenhum deus ou Orixá emanava qualquer tipo de mal, sendo o mal um atributo específico dos seres encarnados.
Para a cultura africana, em linhas gerais, Exu é o mensageiro dos Orixás. Existe outro ser espiritual que também recebe a mesma função, mas, entre os ocidentais, ele é chamado de anjo, do grego “angelus”, o mensageiro. Assim sendo, se você deseja associar a figura de Exu com outro ser encantado, que seja um anjo.
A palavra “exu” significa “esfera” em ioruba. Ele é o grande responsável pela comunicação do Orun (céu/plano espiritual) e o Ayiê (terra/mundo material). Exu é quem leva nossos pedidos e clamores para os Orixás e traz de volta suas respostas, criando uma rede de comunicação simbolizada pela esfera.
Exu, dessa forma, é o grande Orixá mensageiro, da comunicação e do movimento.
A vibração de Exu é indispensável para os seres humanos, pois sem ela o ser entra em desequilíbrio, de forma que nenhuma comunicação externa chega completa ou adequada, e nem mesmo suas expressões internas conseguem ser proferidas. O homem, sem Exu, fica completamente isolado da natureza divina.
É conhecido também como fiscal dos Orixás, cabendo a ele identificar, quais ofertas ou obrigações serão aceitas ou não, quais serão entregues aos Orixás ou não.
Por todos estes motivos, é necessário entender que não existe nada na Umbanda que seja feito sem que Exu seja informado, louvado ou ofertado em primeiro lugar, pois, sem a ação de Exu nada se movimenta.
Até mesmo um simples pedido a qualquer Orixá, deverá ser feito a Exu primeiro ou, ao menos, sua atuação deverá ser solicitada, para que ele encaminhe nossos pedidos ao seu destino.
É por este motivo também que se diz que todo Orixá tem um Exu correspondente, um elo de ligação com o mundo terreno. Os Orixás também sabem que nada conseguiriam fazer na Terra sem o trabalho de Exu. Por esta associação com os Orixás, encontramos Exu em todos os domínios da natureza, mas as encruzilhadas e o cemitério são os mais populares. Muitos atribuem a Exu o rótulo de escravo dos Orixás. Ledo engano!
Exu é um Orixá como qualquer outro, com funções e atribuições bem definidas. Seu trabalho é regido por Olorun. Exu é movimento, o fogo crescente que inicia seu caminho. A evolução dos seres também pode ser atribuída a Exu, pois sem ele nenhum movimento é possível, nem mesmo os movimentos evolutivos.
Por ser Exu que traz as determinações dos Orixás para a Terra, também é entregue a ele o título de “Senhor do Destino”, pois, independente da resolução dos Orixás ser boa ou ruim, é Exu que se encarregará de concretizá-la.
Exu compreende que não importa quem faça, tem que ser feito.
A Exu também pertence todo fluxo de energia. Tanto a afluência (de onde a energia parte) como a confluência (onde as energias se encontram). Por isso portas, porteiras, portões, passagens, caminhos e encruzilhadas, também são atribuídos a ele. O axé também é sua propriedade.
Antigamente não era incomum se dizer que em terreiro que não se tem Exu assentado, não se sente o axé. A energia de Exu pode construir ou destruir. Quando destrói não é por fúria e sim por necessidade de modificação. É a forma que Exu tem para nos dizer que estamos no caminho errado, que é melhor recomeçar.
É conhecido por ser grande adepto dos prazeres da vida. Exu gosta de comer, beber, dançar, rir e fazer amor. Mas, exagero e vulgaridade não fazem parte de seu comportamento. Tudo com muito bom gosto, tudo com muito charme. Sempre muito alegre, animado, inteligente e vivo. A astúcia é uma de suas principais qualidades.
A ele pertence o caminho dos bons e dos maus costumes, independente de serem estes costumes antigos ou novos. Exu também está em nossas sombras internas. O defeito, o vício, aquela porção de nós mesmos que menos gostamos. A sombra só existe onde há luz. Esta luz é Exu, que aceita e compreende nossos defeitos, mas também trabalha para melhorá-los.
A segurança do terreiro e a boa abertura dos trabalhos também cabem a Exu, desde que devidamente ofertado. Sua energia é densa, pesada. Pode modular a polaridade tanto para positiva como negativa, como bem entender. Por este motivo o descarrego de Exu é o mais profundo dentro da Umbanda.
Exu pode trabalhar em qualquer frente: negócios, cura, amor, orientação. Podemos solicitar seu auxílio em qualquer momento.
O Orixá Exu tem como falangeiros Exu e Pombagira. Não confundir o Orixá com seus tarefeiros.
O termo Pombagira tem origem em Angola. Pambu Njila era como os angolanos chamavam a sua versão do Exu ioruba. “Mpambu” em kikongo significa “encruzilhadas” e “Njila”, “caminho”. Pambu Njila é o senhor dos caminhos, das encruzilhadas e dos começos. Muitos dizem que foi através desta versão que Exu ficou conhecido como senhor das encruzilhadas. Também conhecido como Legba (o poder) e Elegbara (senhor do poder).
Na África era comum encontrar em árvores próximas às entradas das aldeias, falos eretos (um dos símbolos de Exu) enormes nelas gravados. Isso simbolizava a proteção de Exu, e mesmo hoje ele ainda é cultuado como grande guardião das cidades.
Exu, para um espírito em evolução, é um título que deverá ser conquistado através do tempo, do trabalho e do merecimento de cada entidade. Uma pessoa por se vestir como um policial, não se torna um; nem quem veste um guardapó se torna médico. Um espírito, apenas por se dizer Exu, não significa que o seja.
Todos já tivemos oportunidades de ouvir nos terreiros espíritos obsessores que se dizerem Caveira, Tranca-Ruas ou Maria Padilha. Esses nomes de falanges são títulos e jamais serão utilizados de forma inadequada por qualquer espírito, e nem se darão a trabalhos negativos ou obsessivos. Precisa-se entender os mecanismos para dissipar dúvidas que surgem dentro dos terreiros. Exu é uma linda patente do plano espiritual.
As imagens de Exu são outro ponto que deve ser mudado. Exu não tem rabo, nem chifre e nem pés de bode. Mais uma vez a mente dos homens, deturpada pela cultura cristã, deturpa o verdadeiro conceito do Orixá.
Exu pode usar terno, capa, cartola, bengala. Pode usar uniforme ou a vestimenta dos cavaleiros, ou guerreiros do passado, mas tenha certeza de que nada lembrará um demônio.
Exu é limpo, correto e certeiro. Exu não bebe demais e, caso o faça, tenha certeza de que tem um motivo, e de que ele levará embora todo o álcool de seu aparelho. Quando o médium fica bêbado, tenha certeza de que Exu nada tem a ver com o fato. Isso é coisa de médium desorientado ou sem preparo.
Exu Orixá também está ligado à contenção de entidades negativas, impedindo seu fluxo de energia. Por este motivo, muitos tarefeiros de Exu (Exu e Pombagira) trabalham em zonas trevosas ou pouco iluminadas. Esses espíritos, quando se manifestam no terreiro, podem inicialmente ter comportamento arredio ou violento.
Associo estas entidades a agentes penitenciários que não podem deixar seu local de trabalho. Passando muito tempo no presídio, o agente acaba por adquirir algumas posturas mais pesadas por puro senso de sobrevivência. Estar próximo e ter que controlar criminosos e malfeitores o tempo todo, pode afetar seu psique.
Mas os trabalhadores de Exu são humildes o suficiente para cumprir suas tarefas da forma que for e onde quer que seja, sem titubear e sem deixar o posto.
Infelizmente ainda existem terreiros de Umbanda que não trabalham com a linha de Exu e nem sequer consideram-no um Orixá. Uma pena. Pois é Exu que dá descarrego e equilíbrio na vida de um médium. Sem Exu a segurança de um terreiro pode ser instável.
Para entender um pouco mais Exu, vejamos as saudações que dedicamos a ele nos trabalhos de Umbanda:
Laroyê (Laruê) - significa o bem-falante, o comunicador. Adapta-se esta tradução por “mensageiro”.
Exu Mojubá - Mo Jubá em ioruba significa “eu me curvo”, Curvo-me a ti Exu.
Ina Ina Mojubá - Iná em ioruba significa fogo ou fogo que resplandece a luz.
Eu me curvo ao fogo que resplandece a luz.
Por tudo isso devemos amar e respeitar Exu como o grande Orixá que é, tendo plena consciência de sua bondade e de sua necessidade.
Em uma das mais célebres e felizes frases de Rubens Saraceni, ele diz:
“Exu é a mão esquerda de Deus”.
Fontes:
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